Resenha - Persuasão


"- Deveria ter percebido a diferença - respondeu Anne. - Não deveria ter suspeitado de mim agora; a situação é tão diferente, e minha idade tão diferente. Se antes errei, deixando-me levar pela persuasão, lembre-se de que foi pela persuasão exercida em nome da segurança, não do risco. Quando cedi, pensei ceder ao dever, mas nenhum dever poderia agora ser invocado. Casando-me com um homem que me fosse indiferente, todos os riscos seriam corridos, e todos os deveres violados".

Meu primeiro livro de Jane Austen, "Persuasão", da L&PM Pocket foi uma experiência boa. Não sei ainda dizer se Austen vai conseguir com seus outros livros, me conquistar, como Emily Brontë me conquistou, mas pretendo ainda esse ano colocar mais um livro seu em minha lista.
Há tempos estava querendo descobrir todo esse fascínio que muitos leitores tinham por essa grande escritora, e me aventurei a começar com seu último livro publicado. "Persuasão" foi concluído um ano antes de sua morte e publicado postumamente - em 1818. O romance contém fortes elementos autobiográficos, aborda o risco de se dar conselhos - e de segui-los.
Anne Elliot, a heroína de "Persuasão", é uma nem tão jovem solteira que, seguindo os conselhos de uma amiga, dispensara, sete anos atrás, o belo e valoroso (porém sem título nobre e sem terras) Frederick Wentworth. No entanto, o futuro sentimental e financeiro de Anne não é muito promissor, e quando o destino a coloca frente a frente com Frederick, agora um distinto capitão da Marinha Britânica, reflexões, conjecturas e arrependimentos são inevitáveis
No livro, a capacidade de persuadir atinge o ápice, visto que no romance são discutidas todas as implicações morais, afetivas e sociais acarretadas pela responsabilidade de se induzir alguém a praticar um ato. Persuadir o outro de fazer ou deixar de fazer algo, de tomar uma decisão ou renunciar a ela, quando isso pode ser vital e irretratável, é algo que deve ser encarado como uma interferência no próprio destino, no futuro, no que virá ou viria a ser.
Na introdução do livro, Ivo Barroso nos deixa claro que Jane vivenciou uma situação parecida em sua vida. Um pouco antes de começar o livro, sua adorada sobrinha, Fanny Knight, pediu-lhe conselhos sobre se devia romper seu já longo noivado ou esperar mais sete anos pela ascensão social e a independência do noivo. Não estando certa de que a sobrinha resistiria à separação, nem persuadida da constância de seu amor, Jane envia-lhe uma carta em que se une toda a compreensão de um ser humano à clarividência de uma romancista de sua têmpera: "É melhor parecer volúvel e talvez nunca mais vir a conhecer um homem que seja igual a este do que comprometer-se sem amor, comprometida com alguém querendo outro". 
Jane passou por situação semelhante, assumindo um compromisso de noivado e renunciando a ele no dia seguinte, talvez por se conscientizar de que realmente não amava o pretendente. Outro ponto de convergência está no fato de sua irmã Cassandra também ter tido um noivado prolongado com Thomas Fowle, que, não tendo condições financeiras para se casar, foi tentar a sorte no Caribe, onde faleceu de febre amarela em 1797. Jane e Cassandra morreram ambas solteiras.
Os críticos veem nesse momento angustiante vivido por Jane Austen o embrião da história central de "Persuasão", em que Anne Elliot desfaz seu compromisso com Frederick Wentworth, um oficial da marinha talentoso, mas pobre, repudiado pela família dela, muito ciosa de seus bens e de sua condição social.
Um livro fácil de ler - apesar da época - e que nos coloca de frente a muitas questões que até hoje, muitos de nós nos deparamos e temos dificuldade para resolver.
Recomendo!

Cláu Trigo

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